pega rex
dog whistle — ou apito de cachorro — é um apito que produz uma frequência ultrassônica fora da faixa auditiva humana, mas dentro da capacidade da audição de cachorros. ao soprar o apito, pessoas próximas não vão escutar mas o cachorro sim. esse apito é usado para adestramento de cães, que podem responder comandos que só eles “entendem”.
em política, “dog whistling” significa empregar alguma mensagem em código misturada no que se fala, de maneira que a população geral escute e veja mas não entenda exatamente, porém, um subgrupo que possui aquela referência vai entender seu recado. o recado codificado significa uma coisa pra população geral, mas significa outra coisa para algumas pessoas que “captam” a referência. o apito serve para enviar um recado aos adestrados, e quem quer que o note, caso aponte esse recado, fica de maluco por ver coisa que “não existe”, escutando mensagens que “não foram ditas” porque — para a população geral — isso na verdade realmente não foi dito diretamente.
um político que se valeu de bastante dog whistling na história recente é o atual presidente americano. acessorado por steve bannon, auxiliado por uma máquina de big data e de consultorias de psicometria, ads, fake news e táticas de psyops, suas mensagens eram simplórias e diretas — em grande parte devido ao tamanho de seu vocabulário bastante limitado. e por mais que muito do que se dizia não parecia ter um significado profundo, em subgrupos da alt-right americana, as mensagens traziam sempre algo mais: um agrado, uma legitimação, um aviso de que o presidente estava do lado deles. mas para a população geral, isso nunca foi evidente. e quem apontava esses acenos ficava de doido mesmo, fazer o que?
steve bannon trouxe essa expertise para a américa do sul por via do biroliro pitoquinho, e o sucesso da operação na land of the free foi repetida na república das bananas ao sul e os paralelos são tão grandes que ai gente precisa de relembrar tudo, mas 10 minuto de google resolve.
a grande sacada do uso do dog whistle é que ao mesmo tempo que ele serve pra mandar recado codificado, ele também serve para deslegitimizar quem os decodifica e pega no flagra. quando se tem um uso indiscriminado do mesmo, por alguém que já é afeito a acenos para grupos extremistas, cada vez que se aponta o seu uso, isso acaba banalizando o seu impacto, e devido à forma como é feito, e como a população em geral realmente não vê nada de mais, cada vez que seu uso é denunciado apenas reforça que existe um “delírio” em quem tá vendo tanta coisa nadave né pô bicho se liga né olha a perseguição
e aí a gente se encontra onde estamos hoje: existe uma simbologia do copo de leite para grupos neonazistas? existe. existem referências diretas e indiretas constantes ao nazismo no governo atual? existem. existe influência do steve bannon nas táticas da presidência? existe. existe um video de um conhecido publicador de notícias falsas parte dessa aparelhagem tomando leite e dizendo que “entendedores entenderão” enquanto outro diz que essa foi “subliminar”? existe sim.
mas também, ao mesmo tempo: existe um tal desafio do copo de leite feito pelo ministério da agricultura? bem…existe. existe um aceno ao agronegócio nisso tudo? é… existe. existe a possibilidade de que a tosquidão do governo é tão grande por conta da cognição limitada do presidente que isso tudo é só uma infeliz uma coincidência? então… se pá existe né?
sendo um aceno neonazi ou não, o dog whistle serve seu propósito de qualquer jeito: incita os morenazi brasileiros que se ligam, e deixa todo anti-bolsonarista que ficou ultrajado na internet jogando essa ref com cara de maluco perante a população geral do país. quem lá sabe o que é alt-right, goebbels, supremacista branco ou até mesmo apito de cachorro? tirando um adestrador ou um mais informadinho aqui e ali, quase ninguém tá entendendo esse ultraje, ponto pros louco que fizeram vocês parecerem mais loucos ainda.
como sair dessa sinuca de bico fica muito difícil, e para além da óbvia solução de tirar o biroliro da presidência na chinelada, vai ser complicado operar dentro das táticas que a extrema direita aperfeiçoou tão bem e vem usando há anos.
